quarta-feira, 18 de outubro de 2023

Livros do mês - outubro II


O que pode acontecer quando um livro se encontra inesperadamente no seu quotidiano com alguém e se essa pessoa for a Rainha, o que poderá ocorrer?

"Num passeio com os seus cães, a Rainha descobre uma carrinha de livros de uma biblioteca itinerante. Pode esse encontro mudar algo do seu quotidiano?
"A Rainha nunca se interessara muito pela leitura. Lia, é claro, como toda a gente, mas gostar de livros era algo que deixava aos outros. Era um passatempo e fazia parte da natureza do seu cargo não ter passatempos. A sua função era mostrar interesse por, não deixar que ela própria se interessasse. Além disso, ler não era fazer. Ela era alguém que faz. (...)

Passados algumas semanas a Rainha sentiu-se perturbada e a pensar porque é que, neste momento particular da sua vida, sentira subitamente atração pelos livros. Donde surgira esse interesse?
Sim, poucas pessoas tinham visto mais mundo do que ela. Estando ela própria na tribuna do mundo, porque se entusiasmava agora com livros que, por muito que pudessem ser, não passavam de um reflexo ou versão do mundo? Livros? Ela vira a realidade. (...)

O apelo da leitura, pensou, vinha da sua indiferença: havia na literatura algo de nobre. Os livros não se importavam com quem os lia, nem se os líamos ou não. Todos os leitores eram iguais, incluindo ela própria. Porém, dúvidas e interrogações eram só o princípio. Uma vez no ritmo normal, deixou de lhe parecer estranho o facto de querer ler, e os livros, aos quais se afeiçoara tão cautelosamente, passaram pouco a pouco a ser o seu elemento. (...)

No seu encontro com Sir Kevin, ele adiantou:
- Se conseguíssemos aproveitar a vossa leitura para um objetivo maior: por exemplo, a melhoria dos critérios de leitura entre os jovens...
- Lemos por prazer - disse a Rainha.
A leitura fez-lhe pensar na escrita, nos que escreviam. E descobriu que depois de escrever alguma coisa, mesmo que fosse só uma nota no caderno, ficava feliz como dantes, depois de ter estado a ler. E ocorreu-lhe que ler era ser um espetador. Escrever era agir, o que ela devia fazer."

Bennett, A. (2009). A Leitora Real. Lisboa: Asa.

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